16 de setembro de 2011

Rumos da privatização da Saúde Pública






A saúde como "caso de polícia" revivendo o início do século XX
e o silêncio pela força, da ditadura militar


A proposta das OS concretizada na transferência da gestão de serviços essenciais para entidades privadas, mantendo o financiamento público, não é uma proposta nova. Se nos anos 80, adiscussão sobre o grau de intervenção na economia já era aguçada, nos anos 90, a abertura do mercado ao capital internacional e às privatizações de estatais com o discurso de que a administração pública era ineficiente, apontou as bases da reconstrução do Estado Brasileiro, pelo viés do modelo neoliberal.

Desta forma, o conceito de gestão veio sendo discutido pelo Plano Diretor de Reforma do Aparelho de Estado, do então Ministro Bresser Pereira, apresentado pela MP 1591/97, que foi convertido em Lei 9637/98, trazendo em seu bojo a idéia de Publicização, incorporado pelo Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE).

A proposta do referido plano diretor propunha como indicadores:

-reduzir o Estado em termos de pessoal, através de privatizações, terceirizações e publicizações;

- criar programas de desregulamentação que aumentasse mecanismos de controle via mercado.

Nota-se, no embasamento, não mais a discussão do público ou privado, mas uma forma híbrida de gestão que pudesse promover uma administração com forma de controle nos resultados e do aumento da competitividade. Nesse âmbito, alguns discursos são forjados para dar conta dessa nova configuração do Estado.

Sem trabalhar com a idéia básica de uma privatização, onde teríamos a transferência simples das atividades que podem ser controladas pelo mercado, porque não essenciais, para a iniciativa privada, criou-se uma descentralização para o setor público intitulando-o de Não-Estatal. Entidade responsável pela administração de serviços públicos essenciais, mas de personalidade jurídica de direito privado, logo não é totalmente pública nem privada, mas uma figura jurídica nova, que rearruma o Estado pelo processo denominado de publicização. Assim, as OS são organizações sem fins lucrativos, não-estatais, de pessoa jurídica de direito privado. São dirigidas à educação, saúde, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, preservação ambiental e cultura.

A denominação Organizações Sociais (OS) é uma nome que se pretende singelo, talvez irônico, para indicar as Não-Estatais, trazendo no caso da saúde, um movimento destrutivo frente às conquistas das Leis 8080/80 e 8142/80, que organiza o Sistema Único de Saúde e regulamenta o Controle Social, respectivamente, com graves repercussões negativas ao que se referendou na Constituição Federal de 1988, nos artigos sobre a Saúde Pública.

O que está em jogo é a redução do direito à saúde como garantia de cidadania do povo brasileiro, visto que, o processo das dotações orçamentárias ocorre sem qualquer consideração sobre o processo de descentralização em curso, onde os critérios estavam dimensionados pela exigência de controle social e análise regional das necessidades da população para equacionar gastos e demandas. As OS, por serem entidades jurídicas privadas não prestam contas à lei da responsabilidade fiscal.

Descarta-se a equidade nos atendimentos, assim com sua integralidade, pois as OS permitem a celebração de convênios com planos de saúde privados e seguros saúde, instituindo a porta de dupla entrada, SUS e conveniados, com possibilidade de atendimentos diferenciados à população.

Inserção de recursos humanos sem concurso público e por quarteirização mostram a fragilidade dos vínculos trabalhistas dos profissionais de saúde, a partir da instauração das OS, nos serviços de saúde.

Essa abordagem dos serviços públicos essenciais pela gestão das OS, tem recebido inúmeros movimentos contra a sua marcha, entre eles, destacamos a medida cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADIN 1923.

Do documento denominado “Contra fatos não há argumentos que sustentem as Organizações Sociais no Brasil”, organizado por movimentos sociais, sindicatos, Conselhos e várias entidades de âmbito nacional que compunham a Frente Nacional pela procedência da ADI 1.923/98,recortamos casos que indicam a total incompatibilidade das OS com as propostas de saúde agenciadas por princípios de universalidade, equidade e integralidade, com respeito à cidadania:

- Fraudes nas compras de equipamentos: “como é o caso da Organização Social Amplus que deixou de operar serviços de raios-X e ultrassonografia em 58 unidades do estado de São Paulo sem ao menos ter instalado os equipamentos exigidos no contrato de R$ 108 milhões feito com a prefeitura”.

- Diminuição da oferta de serviço: “constatou-se em vistoria ao hospital municipal São Luiz Gonzaga, no Jaçanã (zona norte), que a OS Irmandade da Santa Casa de São Paulo não vinha realizando ultrassons e raios-X no hospital, apesar de receber para isso R$ 1 milhão por ano. (Folha de São Paulo, de 10/08/2010)”. ‘

- Grandes esquemas de corrupção, na corrida pela capitalização da saúde: “a OS contratada pela prefeitura do Rio para gerenciar profissionais e executar o Programa Saúde da Família nas regiões da Tijuca, Jacarepaguá, Barra da Tijuca e Irajá está sendo acusada, no Paraná, de desvio de R$300 milhões nos cofres públicos. [...]Segundo investigação conjunta da Controladoria Geral da União, Ministério Público, Polícia Federal e Receita Federal. O Centro de Apoio a Profissionais (Ceap), que rendeu R$ 1 bilhão em cinco anos, fazia parcerias com as prefeituras e desviava pelo menos 30% do valor. O esquema teria ramificações no Paraná, São Paulo, Goiás, Maranhão e no Pará. (O Dia em 25/05/2010)”.

- Ausência total de licitação para gastos do dinheiro público: “no Rio de Janeiro, do total de mais R$ 500 milhões gastos pela Secretaria Estadual de Saúde só com medicamentos e material médico-hospitalar para hospitais e UPAs em 2009, 13,7% correspondem a compras feitas sem licitação, sob a alegação de que eram aquisições emergenciais. Por causa disto, o governo pagou um preço mais alto pelos produtos”.

- Precarização das condições de trabalho e do atendimento à população: “Em São Paulo, oPrograma Saúde da Família (PSF), somente em 2009, deixou de atender 700 mil pessoas. A prestação de contas apresentada pela Secretária Municipal de Saúde mostra que há 4,1 milhões de pacientes cadastrados atualmente na lista municipal; onde em 2008, haviam 4,8 milhões.Porém, a capital do estado atualmente conta com 1.184 equipes de PSF’s, enquanto em 2008 haviam 1.224. Entretanto, segundo dados do Ministério da Saúde, o número de equipes cadastradas são ainda menores (nos registros do Governo Federal só existem 960 equipes cadastradas).

(http://oglobo.globo.com/rio/mat/2010/05/21)”.

Projeto de extensão UFF. Agenciamentos coletivos: SUS e a Saúde do Trabalhador em debate. Prof. Dra. Marilene Verthein; Fernanda Castro; Simone Guimarães; Lívia Assis; Rebeca Carletto; Daiane Guedes e Edwalton Silva.

Nenhum comentário: